“A língua é a única herança que me coube em sorte, e não é pequena, como se sabe.[…]
in Poesia, Terra de Minha Mãe de Eugénio de Andrade
Hoje, dia 21 de fevereiro, celebra-se o Dia Internacional da Língua Materna. A data é assinalada anualmente e pretende valorizar a diversidade linguística e o multilinguismo como sinónimos de um desenvolvimento sustentável.
As línguas não são estáticas, estão em constante evolução, progridem de acordo com as necessidades de comunicação dos falantes e do contexto social. O tema escolhido para este ano é “Fomentar o multilinguismo para a inclusão na educação e na sociedade”.
Não só é importante a preservação linguística como também a promoção dos valores multilingues que hoje em dia são utilizados por um grande número de falantes na população do mundo.
O Dia Internacional da Língua Materna foi proclamado pela UNESCO, em 1999, com o objetivo de proteger e salvaguardar todas as línguas faladas no Mundo, honrando tradições culturais e respeitando a diversidade linguística.
A literatura é um dos modos de preservar a língua de um país. É através da poesia que assinalamos o Dia Internacional da Língua Materna, deixando-lhe o poema de Jorge de Sena:
Camões dirige-se aos seus contemporâneos
Podereis roubar-me tudo:
as ideias, as palavras, as imagens,
e também as metáforas, os temas, os motivos,
os símbolos, e a primazia
nas dores sofridas de uma língua nova,
no entendimento de outros, na coragem
de combater, julgar, de penetrar
em recessos de amor para que sois castrados.
E podereis depois não me citar,
suprimir-me, ignorar-me, aclamar até
outros ladrões mais felizes.
Não importa nada: que o castigo
será terrível. Não só quando
vossos netos não souberem já quem sois
terão de me saber melhor ainda
do que fingis que não sabeis,
como tudo, tudo o que laboriosamente pilhais,
reverterá para o meu nome. E mesmo será meu,
tido por meu, contado como meu,
até mesmo aquele pouco e miserável
que, só por vós, sem roubo, haveríeis feito.
Nada tereis, mas nada: nem os ossos,
que um vosso esqueleto há-de ser buscado,
para passar por meu. E para outros ladrões,
iguais a vós, de joelhos, porem flores no túmulo.
1963, Jorge de Sena
Metamorfoses. Edições 70, Lisboa, 1988